Como a Decah ajudou o Greenpeace Brasil a atualizar sua jornada para os próximos 3 anos

Vinicius De Paula Machado
11 min readNov 30, 2023

Em um mundo em constante mutação, onde a sustentabilidade e a conscientização ambiental tornaram-se não apenas tópicos de discussão, mas imperativos para a sobrevivência no planeta, o papel de organizações como o Greenpeace (GPBR) nunca foi tão crucial.

Contudo, mesmo gigantes ambientais não estão imunes aos desafios de adaptar-se a novas realidades, tecnologias e demandas da sociedade. É com uma mistura de humildade e entusiasmo que compartilhamos a consultoria em formato de jornada em que mergulhamos, junto a essa icônica instituição, para esboçar o planejamento estratégico dos próximos três anos.

Embarque conosco nessa narrativa, não apenas para descobrir a estratégia de engajamento adotada, mas para compreender o coração pulsante e a paixão que alimenta a missão do GPBR.

1. Os caminhos de transformação que se desenhavam

O processo de planejamento anterior revelou uma série de desafios internos que moldaram a maneira como abordamos cada etapa.

O primeiro obstáculo que encontramos foi a sombra de um trauma associado ao governo anterior, garimpo em terra indigena, desmonte dos órgãos de controle e ebulição climática. Esse histórico complexo aumentou a pressão e a necessidade de sensibilidade de todos ao conduzir o novo planejamento.

Outro aspecto foi a chegada de uma nova liderança executiva e formação da diretoria. Isso sinalizava uma era de transformação e renovação dentro da organização. A introdução de novos líderes trouxe consigo uma diversidade de perspectivas, experiências e habilidades, que se manifestaram em uma abordagem revigorante para os desafios enfrentados. A nova diretoria não apenas enfatizou a importância de adaptar-se às mudanças do cenário global, mas também reforçou a necessidade de uma cultura organizacional inclusiva, colaborativa, atenciosa e inovadora.

Essa transição, embora desafiadora em vários aspectos, representou uma oportunidade valiosa para o Greenpeace reavaliar sua missão, alinhar-se com as demandas contemporâneas e nutrir sua paixão em defesa do meio ambiente no dia a dia.

Ainda no lado de dentro, a média gerência expressava uma necessidade de reorientação e alinhamento, o que indicava a necessidade de que o planejamento pudesse ser mais distribuído por toda organização, reduzindo assimetrias e fortalecendo uma cultura ainda mais participativa.

Paralelamente, o comprometimento do GPBR com equidade, diversidade e inclusão, embora seja um ponto forte da organização, também apresenta seus próprios desafios, garantindo que esses valores fossem consistentemente trazidos à tona em todas as etapas do planejamento.

2. Nossas premissas metodológicas

A criação do novo plano estratégico foi uma tarefa que demandou não apenas expertise, mas, acima de tudo, empatia, adaptabilidade e uma visão holística. Com esta responsabilidade, colocamos em prática nosso DNA colaborativo e premissas metodológicas para navegar por este desafio.

Nossos dez anos de experiência versátil se revelaram essenciais para este projeto. Tendo atendido uma gama variada de clientes — desde startups a corporações consolidadas, passando por governos e várias Instituições do 3º Setor ONGs, Institutos, Fundações e Órgãos de Fomento — nos trouxe uma riqueza de perspectivas e aprendizados.

Abraçamos uma abordagem híbrida, que integrou o digital ao físico. Esta metodologia nos permitiu adaptar nossos processos de forma dinâmica, conforme as demandas dos participantes e processo de amadurecimento da Instituição convidando membros de equipe de diversas localidades do país.

Entendemos que para construir uma estratégia bem-sucedida e com senso de pertencimento, foi crucial envolver os stakeholders em várias camadas, uma verdadeira cocriação por adição. Assim, garantimos que cada voz fosse ouvida, cada perspectiva fosse considerada e cada desafio fosse diagnosticado. Isso incluiu a alta liderança, que forneceu a direção estratégica; a média liderança, trazendo insights práticos; as equipes, que garantiram diversidade de perspectivas do dia a dia; e o amplo ecossistema de stakeholders, que abrange conselheiros, especialistas e outros escritórios do Greenpeace parceiros. Como dizemos por aqui, esse é o Design Centrado no Ecossistema (Ecosystem Center Design).

Em cada etapa, as múltiplas perspectivas que convergiam garantiam que nossa estratégia para o GPBR fosse robusta, inclusiva e preparada para enfrentar os desafios do presente e estimular futuros mais inspiradores. Acreditamos que esta abordagem colaborativa e a de cocriação por camadas de percepção foi o diferencial que possibilitou alinhamentos de um futuro promissor.

3. Como foram as etapas do planejamento

Estruturamos nossa abordagem em três módulos sequenciais e interconectados.

M1 — Início e Fundamentação:

No começo da nossa jornada, realizamos uma análise aprofundada que incluiu a revisão de mais de 30 relatórios e estudos anteriores, além de entrevistas detalhadas com líderes de cada área. Este processo revelou não apenas desafios e sucessos passados, mas também perspectivas futuras, sendo as reuniões de alinhamento com a direção (SMT) fundamentais para capturar as visões e aspirações iniciais. Os principais objetivos incluíram iniciar reflexões com a Diretoria sobre o contexto e a visão futura do GP, e definir o frame geral para o GPBR, com o intuito de alinhar o diagnóstico atual e inspirar a organização de frentes estratégicas para o plano estratégico de 3 anos.

Foi apresentado um relatório oferecendo uma visão comum sobre o contexto externo, desafios e oportunidades, incluindo tópicos como COP30 e as eleições municipais e presidenciais. O processo também envolveu o nivelamento sobre as próximas etapas e a glocalização da Teoria da Mudança global do Greenpeace. Essa fase incluiu dinâmicas de apoio e a geração de uma lista de “cláusulas pétreas” , compromissos fundamentais para os próximos três anos. Finalmente, discutimos o alinhamento sobre as perspectivas de arrecadação e estratégias de fundraising.

M2 — Interação e Cooperação:

O segundo momento foi a vez de trazer para o jogo a segunda camada de interação, a média gerência (MMT). As sessões cobriram áreas como campanhas, engajamento, captação de recursos, operações, finanças, RH, integridade/diversidade, TI e transformação digital. A proposta era que cada sessão fosse dividida em momentos de exploração do que havia sido construído na etapa anterior, reflexão sobre contexto sob um ótica mais especializada de cada área e preparação da etapa de convergência final que viria mais à frente.

A problematização do frame estratégico envolveu discussões para compreender a lógica por trás da nossa narrativa guarda-chuva / tese de mudança. Utilizamos como abordagem que favorece a segurança psicológica, o formato de aquário e anotações no Miro, incluindo sandbox com destaques e dúvidas, seguido por uma sessão plenária para esclarecimentos dos líderes.

No contexto interno e externo, avaliamos o ambiente ao redor do Greenpeace. Cada participante contribuiu com uma análise SWOT individual, considerando aspectos internos, externos e globais.

A problematização da Teoria da Mudança global do Greenpeace focou em desenvolver uma estratégia local robusta e alinhada com esta teoria. O trabalho consistiu em estabelecer relações entre nosso frame e a Teoria da Mudança.

Nós na Decah temos bastante experiência na glocalização de teorias de mudança globais e relações de governança com instituições do 3o setor / ecossistemas de impacto com atuação em vários países ao longo de nossa história. No caso do Greenpeace, olhamos para as melhores práticas globais para servirem como alavancas de inovação na criação do novo plano do GPBR.

Finalmente, geramos perguntas reflexológicas para orientar o planejamento estratégico e futuras tomadas de decisão. Identificamos quais perguntas seriam abordadas no M3 e quais precisariam de outros processos.

M3 — Finalização e Implementação:

Nesta etapa, o foco principal foi a construção dos projetos e frentes estratégicas para o Plano de Três Anos, uma tarefa compartilhada entre a direção e a média gerência. Além disso, a integração de informações globais do plano foi uma prioridade, com ênfase na criação da versão inicial das frentes programáticas e na definição dos objetivos complementares dos departamentos. Foi essencial a participação de Decah, em sessões de alinhamento e imersões do SMT em São Paulo e Manaus, assim como as sessões de escuta com o Conselho e as reuniões com o global e outros escritórios para termos uma visão integrada de todo o processo.

Os workshops departamentais se concentraram na discussão inicial das frentes programáticas, abordando também a correlação com o global, o Frame, as Cláusulas Pétreas e o contexto. Houve também um foco na ideação de projetos com a técnica Lotus Blossom e na definição da “trinca criativa”, que incluiu o eixo, métodos de execução e alavancas de inovação.

A globalização da estratégia, abrangendo gatilhos globais, corresponsabilidades e colaborações entre outros escritórios do GP, foi igualmente relevante.

As sessões finais foram dedicadas à consolidação de aprendizados e encaminhamentos pela direção, organizadas em três rodadas. A primeira rodada explorou o propósito e o objetivo estratégico de cada departamento. A segunda rodada focou em como o departamento poderia ser mais impactante no plano, explorando objetivos primários e secundários. A terceira rodada abordou os próximos passos e as ajudas necessárias, com um olhar para o futuro e o detalhamento dos resultados desejados.

A culminação desse processo de planejamento foi um evento singular de compartilhamento com toda a equipe, realizado em um momento semanal dedicado ao encontro de todo o time. Nesta ocasião especial, apresentamos o plano trienal a toda a organização, convidando cada membro a dar os seus “pitacos” finais. Este foi um espaço aberto para expressar o que cada um achava mais empolgante, os desafios percebidos, aspectos que não estavam claros e outros pontos que mereciam destaque.

Esse encontro se mostrou extremamente valioso para a integração e cuidado com o envolvimento de todos na organização, para justamente chegarmos naquele nosso primeiro grande objetivo essencial desse trabalho: trazer pertencimento e apropriação de cada pessoa na organização ao plano que estava sendo traçado para os próximos 3 anos.

4. O que o Greenpeace Brasil leva para sua caminhada

Com um processo participativo, não é surpreendente que tenhamos colhido resultados tangíveis e significativos. A integração da nossa metodologia com a paixão e comprometimento do GPBR produziu uma estratégia que muito tem a ver com a organização e os anseios atuais da sociedade.

Transversalizamos e interseccionalizamos temas para obter metas e métricas assuntos como o enfrentamento ao racismo ambiental, a busca por justiça climática, a importância dos dados sobre a ebulição do planeta, o combate ao desmatamento e a mineração, o papel do sistema financeiro na perda de biodiversidade, a valorização de povos e comunidades indígenas e tradicionais, a necessidade de superarmos os combustíveis fósseis, a mobilização das novas gerações em torno da pauta climática e a utilização da comunicação, da cultura e da tecnologia como ferramentas de engajamento. Sendo assim, chegamos a:

Claridade Estratégica

O processo nos permitiu definir um caminho claro. Com o alinhamento dos objetivos, metas e indicadores de desempenho, o Greenpeace Brasil agora tem um norte inspiracional e estratégico definido para os próximos anos. O mapa estratégico, fruto deste trabalho, serve como um guia constante para a equipe, garantindo que cada ação e decisão esteja alinhada com o objetivo maior da organização.

Alinhamento Organizacional

Um dos resultados mais tangíveis foi a integração de várias camadas da instituição na construção coletiva. As sessões de cocriação e discussão garantiram que todos os níveis da organização estivessem alinhados, desde a alta liderança até às equipes operacionais. Esta coesão interna é uma força poderosa, permitindo uma implementação mais eficaz e ágil das iniciativas estratégicas no dia a dia.

Integração de Perspectivas

Ao envolver stakeholders de várias camadas, conseguimos uma estratégia rica e multifacetada com alto índice de senso de pertencimento. Cada perspectiva adicionou profundidade e nuance ao plano. Isso não apenas aumentou a robustez da estratégia, mas também garantiu sua autenticidade em diversos contextos.

Preparação para Desafios Futuros

Nossa análise SWOT, juntamente com as discussões em torno do contexto externo, preparou o GPBR para antever e enfrentar desafios emergentes. A estratégia agora tem embutida a flexibilidade necessária para se adaptar a cenários em constante mudança, seja no cenário político, social ou ambiental.

Engajamento e Propriedade

O processo inclusivo fez com que todos se sentissem parte integrante da estratégia. Há um sentido palpável de propriedade entre os membros da equipe. Isso, por sua vez, garante um comprometimento mais profundo com a visão e missão da organização.

Validação Externa

Ao envolver o Conselho e a equipe de suporte do global (GPI mais 2 escritórios de outros países), a estratégia também foi validada externamente. Isso não só reforça sua robustez, mas também garante que o GPBR permaneça alinhado com os objetivos globais e se beneficie de perspectivas e parcerias externas.

5 O propósito segue firme

Seguimos por aqui na torcida para que os resultados deste planejamento estratégico ajudem a impulsionar as definições sobre o curso do GPBR nos próximos anos, permitindo-lhes a seguir enfrentando desafios com determinação, abraçando oportunidades com ousadia e inspirando gerações de ativistas. Tudo isso entendendo a grandiosidade dessa organização e a importância de todas as pessoas que contribuem com ela e dividem a mesma visão de mundo e propósito de mudança.

Esta jornada nos lembrou do imenso valor das organizações que se dedicam a causas maiores do que elas mesmas e da importância de estratégias delineadas e objetivos definidos de forma coletiva nesse setor (iniciativas, por exemplo, como a Coalizão O Clima é de Mudança, que já mostramos por aqui). O propósito tem que ser coletivo, interna e externamente, para que o futuro seja possível.

Em tempos de incerteza e mudança, o Greenpeace Brasil permanece como um baluarte de esperança, determinação e resiliência.

Em nome de toda a equipe da Decah, agradecemos ao GPBR pela oportunidade de fazer parte desta jornada transformadora. Estamos ansiosos para testemunhar os frutos deste planejamento nos próximos anos e continuaremos a apoiar e admirar a missão indomável do Greenpeace Brasil.

Este artigo é assinado por Marcele Oliveira e foi elaborado em colaboração com toda a equipe do projeto Decah

Marcele Oliveira é cria de Realengo, da Zona Oeste do Rio de Janeiro. Graduada em Produção Cultural pela UFF — Niterói, atua como produtora, comunicadora e ativista climática. É mestre de Cerimônias do Circo Voador e Jovem Negociadora pelo Clima da Secretaria de Meio Ambiente RJ. Faz parte da Agenda Realengo 2030, que integra a Coalizão O Clima É de Mudança pautando racismo ambiental e justiça climática pela perspectiva da juventude periférica. Está no GT de Comunicação na Articulação por um Conselho Nacional de Juventudes pela Ação Climática e também constrói em conjunto a Conferência Nacional de Favelas. É liderança formada pelo curso de políticas públicas da Casa Fluminense e pesquisadora no âmbito de direito à cidade e participação social. Multiplicadora B, Integrante da rede de especialistas Decah como facilitador e estrategista de impacto nas áreas de clima, juventude e economia criativa, e membro do conselho desta Empresa B

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Vinicius De Paula Machado

Empreendedor social, sócio fundador da Decah uma empresa B que fomenta comportamento colaborativo para catalisar cultura de inovação social